PORQUE O BRASIL NECESSITOU DE IMIGRANTES?

A partir da segunda metade do século XIX, com a proibição do tráfico negreiro em 1850, através da Lei Eusébio de Queiroz, associada a uma expansão considerável da cultura cafeeira no Brasil, houve grande carência de mão de obra nas lavouras, pois os escravos envelheceram na segunda metade do século e o café expandia-se progressivamente. Para reposição de mão de obra, a imigração seria a solução, pois os abolicionistas ganhavam espaço a cada dia.  A política brasileira de imigração mudou sua perspectiva de colonização, para substituição de mão-de-obra.

Até final do século XIX as fazendas do café possuíam mão-de-obra escrava predominante, e a região mais concentrada neste tipo de trabalho, era o Vale do Paraíba na Província de São Paulo.  A partir de 1870, com a divisão do trabalho nas lavouras de café, e a criação da Lei do Ventre Livre, os fazendeiros se deram conta que a escravidão no Brasil estava bem próximo do  fim. Em 1881, o tráfico de escravos interprovincial sofreu um novo golpe, já que a província de São Paulo impôs tributação de 2 contos de réis para transferir escravos entre províncias. A partir desses acontecimentos, os fazendeiros iniciaram junto ao governo, a idéia de imigração em massa. Os fazendeiros daquela época não eram necessariamente escravagistas ou abolicionistas, mas reivindicadores de mão-de-obra. A produção do café naqueles tempos batiam recordes de produção. Em 1898, a produção brasileira dobrou em relação a 1880.

“Venham construir os seus sonhos com a família. Um país de oportunidade. Clima tropical e abundância. Riquezas minerais. No Brasil vocês poderão ter o seu castelo. O governo dá terras e utensílios a todos.

Fonte: www.vanillamagazine.it

Essa era a propaganda feita no norte da Itália para convencer as pessoas a virem para o Brasil. Dos consulados latino-americanos  saíam este tipo de panfleto, uma guerra de propaganda tipográfica entre Brasil, Argentina e Uruguai  para atrair o imigrante. Nas províncias e pequenas cidades, os agentes de emigração, que trabalhavam para as empresas de navegação, contavam com a ajuda de professores, dos prefeitos e da Igreja Católica para incentivar a população a emigrar. Os agentes recebiam porcentagem da venda de bilhetes das empresas de navegação ou eram pagos pelos governos que buscavam os imigrantes.  Após 130 de imigração, podemos questionar se o melhor foi ter vindo pra cá, ou ficado naquela situação de fome e penúria extrema.  Alguns historiadores defendem a hipótese, de que se não houvesse ocorrido a emigração em massa, a Itália certamente teria sucumbido em mais guerras e mais misérias.  Para muitos o Brasil foi motivo de progresso e alívio, para outros, representou o fracasso e a manutenção de sofrimento contínuo.

Para atrair imigrantes, o governo brasileiro efetuava contratos com empresas ou particulares. O mais famoso foi o firmado entre o governo federal e a Companhia Metropolitana, que pretendia trazer um milhão de imigrantes ao Brasil num espaço de dez anos. Embora essa meta não tenha sido alcançada, não eram raros os contratos que estipulavam a vinda de 50 ou 60 mil imigrantes.

DETALHE DA CAPA DO JORNAL ‘O ESTADO DE S. PAULO’ DE 6 DE AGOSTO DE 1892

O jornal O Estado de S. Paulo de 30 de julho de 1892 publica um termo de modificação de um contrato entre o governo do Estado e a Sociedade Protetora de Immigração que trata da introdução de 50 mil imigrantes em São Paulo. Os agricultores devem constituir 95% dos trabalhadores, exige a primeira cláusula, com os demais 5% podendo ser “operarios de artes mechanicas industriaes e que se destinem ao serviço domestico”, de “moralidade comprovada”, podendo ser italianos, alemães, austríacos, portugueses, suíços, suecos e canarinos (das Ilhas Canárias). Devem, como sempre, ter família, não mais que 45 anos, sendo que os “primos não são considerados como fazendo parte de uma família”, bem como os sobrinhos e netos. São abertas exceções, como no caso de “haver um homem válido”, ou pela idade.

No dia 6 de agosto do mesmo ano, o diário paulista divulga na primeira página um dos principais contratos desta década, e possivelmente um dos maiores já realizados em toda a História do país. Fora celebrado no dia 2 de agosto entre o governo federal e uma empresa – a Companhia Metropolitana – para a introdução de um milhão de imigrantes provenientes da Europa e de possessões portuguesas e espanholas, no prazo de 10 anos, a contar de primeiro de janeiro de 1893. Como registra o próprio edital, a Companhia Metropolitana de Imigração era de propriedade do engenheiro Carlos Augusto de Miranda Jordão, um empresário com grande entrada no governo e que possui terras em distintos lugares, como Minas Gerais e Santa Catarina1. A introdução anual não poderia exceder os cem mil imigrantes e nem ser inferior a 50 mil, podendo o governo aumentar esta meta mediante aviso prévio de quatro meses. Apesar da meta máxima não ter sido cumprida, o que estava previsto em contrato, os anos seguintes foram de intensificação da imigração subsidiada.

A empresa se obrigava, por meio do documento, a introduzir imigrantes “que constituirão famílias” na proporção de 90% de trabalhadores agrícolas e 10% de “artistas ou profissões úteis”. O contratante deve trazer ainda imigrantes de “diversas nacionalidades” – desde que europeus, conforme artigo anterior – sendo o máximo anual por nacionalidade de 60%. Toda família, diz o contrato, deveria ter pelo menos um “homem válido”. Além disso, os cônjuges que vierem só deverão ser “inteiramente válidos” e não podem ter mais de 45 anos de idade. Uma das exigências para a empresa contratante é a de repatriar aqueles que não corresponderem às condições exigidas pelo contrato, com o governo podendo repatriar o imigrante e enviar a conta para a empresa em seguida. “Se, porém,” – diz o contrato, abrindo uma exceção – “o immigrante a repatriar fòr válido, morigerado, sem defeito physico e trabalhador, poderá a companhia contractante deixar de repatria-lo, desde que o mesmo immigrante prefira estabelecer-se no Brasil, fazendo terminante declaração aos agentes da inspectoria geral das terras e colonisação”. Uma vez selecionado, diz o contrato reproduzido pelo jornal paulista, as condições deveriam ser as melhores possíveis: viagem de primeira classe com acomodações higiênicas, tempo máximo de trajeto pré determinado, alimentação “sadia e abundante”, atendimento médico a bordo. Para a Companhia Metropolitana, o contrato ainda prevê, em seu artigo 27, outro benefício: a preferência, caso haja igualdade de condições, para celebrar com o governo Federal “novos contractos de igual natureza que tenham de ser celebrados”.

Mapa da Província de São Paulo, indicando as linhas ferroviárias e áreas despovoadas de 1886 para atrair os imigrantes:

Fonte: pt.wikipedia.org

Em 1894, os serviços de imigração foram transferidos do governo federal para os estados-membros. Apenas os estados mais ricos, como São Paulo, puderam prosseguir na política de imigração. A passagem gratuita de navio oferecida pelo governo brasileiro surtiu grande efeito na Itália, já que os agricultores não possuíam quaisquer condições de arcar com essas despesas.  A imigração subvencionada constituiu, em São Paulo, 89% da imigração total entre 1891 e 1895. Embora o governo estipulasse que apenas agricultores aptos ao trabalho deveriam ser recrutados para imigrarem para o Brasil, na prática os agentes e subagentes contratados na Europa para atrair imigrantes, recrutavam qualquer um. Isso acarretava em litígios logo na chegada, uma vez que no meio dos jovens camponeses também chegavam velhos, crianças de peito e mulheres em gravidez avançada. Os problemas não paravam por aí, uma vez que era comum que imigrantes fossem forçados a pagar a sua passagem, mesmo quando tinham direito à passagem gratuita. Os agentes de emigração foram os grandes responsáveis pela vinda em massa de italianos para o Brasil. Em 1892, existiam na Itália 30 agências de emigração e 5 172 subagentes que perambulavam pelo país persuadindo as pessoas a irem para o Brasil. Em 1895, o número de agências havia crescido para 33 e o de agentes para 7 169. Os agentes eram contratados pelas companhias de imigração e eram conhecidos pela sua falta de honestidade. Passavam pelas aldeias nos dias de feira ou mercado, vendendo uma ideia positiva do Brasil, dizendo que era o país do ganho assegurado e onde a propriedade rural estava ao alcance da mão. A companhia de imigração La Veloce pagava entre 5 e 25 dólares para o agente que conseguisse convencer uma família a imigrar para o Brasil.

A imprensa da época comparava os agentes aos traficantes de escravos. As aldeias eram inundadas com panfletos e cartas falsificadas de emigrantes que já tinham partido.

BIBLIOGRAFIA:

  1. https://pt.wikipedia.org/wiki/Imigração_italiana_em_Minas_Gerais
  2. https://pt.wikipedia.org/wiki/Imigração_italiana_no_Brasil
  3. http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-01882007000200009

Gonçalves, Paulo César (Catálogo USP) – Tese de Doutorado: Mercadores de braços: riqueza e acumulação na organização da emigração européia para o novo mundo. São Paulo 2008.

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